O modelo de parceria público-privada (PPP) ganhou a preferência das administrações públicas no Brasil, e tornou-se uma estratégia para a realização de obras até então inviáveis. Além de dividir os riscos entre governo e iniciativa privada no empreendimento, também transfere o custeio para as mãos da empresa, oferecendo como contrapartida um contrato de longo prazo com pagamentos do poder público e dos usuários.
De acordo com a edição de maio do iRadarPPP, que faz o mapeamento das tendências de mercado dessas parcerias, existiam 5.300 projetos em andamento em todo o país. A publicação, que é a mais recente da Radar PPP, aponta que eles estão distribuídos em 19 setores, com predomínio para o saneamento básico, onde estavam situadas mais de 1.300 obras. A iluminação pública aparece em seguida, com 703 iniciativas. Juntos, todos os projetos têm um valor estimado de R$ 1,6 trilhão.
Mas há um detalhe que vem chamando a atenção em parte dos contratos de PPP: a presença de cláusulas de dispute board. O mecanismo prevê a criação de uma comissão especialista no objeto do contrato para acompanhar a execução da obra ou do serviço e dar solução rápida aos eventuais conflitos que possam surgir entre as partes durante a vigência da parceria. Isto significa que, em situações que envolvem divergências contratuais, a questão não vai inicialmente para o Poder Judiciário, mas para o próprio comitê.
“O dispute board tem um caráter tão preventivo que ele pode ser instalado não somente mediante existência do conflito, mas idealmente de forma permanente, já na fase inicial das obras ou serviços”, explica Camila Linhares, da Unniversa Soluções de Conflitos, empresa especializada em soluções extrajudiciais de conflitos. Ela chama a atenção ainda para a legitimidade do comitê a partir da resolução alcançada.
Um estudo publicado pela Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo dá sustentação às deliberações tomadas no dispute board, e aponta que as decisões emitidas pelo comitê devem ser mantidas até posterior ratificação ou revogação pela arbitragem ou pelo Poder Judiciário. Nos últimos anos vem ganhando espaço a celebração de cláusulas escalonadas, nas quais há previsão de dispute board para o acompanhamento da execução do contrato de duração continuada e, se isso for insuficiente, leva-se o conflito para a arbitragem, afastando a necessidade de intervenção judicial se assim desejarem os contratantes.
“Há um amplo processo em andamento de regulamentação dos comitês formados por dispute boards junto ao direito público no país, e isso ajuda a ratificar a autonomia desse tipo de resolução extrajudicial”, afirma Daniel Secches, também da Unniversa. “A presença de profissionais especializados com autonomia para tomar decisões rápidas e mais satisfatórias à realidade das partes tende a gerar soluções mais adequadas e efetivas do que as decisões derivadas de judicialização, geralmente emitidas anos depois da controvérsia e raramente por especialista na temática”, pontua.
Houve um grande impulso à utilização dos comitês com o advento da nova Lei de Licitações, que expressamente incentiva o método, ademais condizente com as melhores práticas internacionais de governança e, de forma mais ampla, de ESG.
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